domingo, 1 de abril de 2012

O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES



1. DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

A Constituição da República de 1988, corolário da Declaração Francesa, traz em seu texto a tripartição de poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário). Além disso, protege essa tripartição em nível de cláusula pétrea fundamental (art. 60, § 4º, III).

“A Constituição é o texto em que se asseguram ou garantem certos direitos (liberdade, igualdade) e se diz como se forma a ordem estatal e se separam os podêres” .

Os três poderes são autônomos e independentes entre si. No entanto, um poder complementa o outro, sendo o Legislativo o mais importante de todos eles.

“O princípio da separação ou divisão dos Poderes foi sempre um princípio fundamental do ordenamento constitucional brasileiro” . Na Carta Política de 1988 o princípio fundamental da separação dos poderes está descrito expressamente no artigo 60, § 4º, III:

Art. 60, § 4º.Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

(...) III- a separação dos Poderes.

Toda cláusula pétrea, como é cediço, não pode ser abolida ou mitigada, e sim ampliada.

De acordo com o art. 16 da Declaração Revolucionária Francesa de 1789, ‘qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição’. Assim, ainda que o art. 2º da CF não existisse, a separação dos Poderes, consagrada também no § 4º do art. 60 da Constituição, seria princípio extraído do próprio Estado Democrático de Direito . (sem destaque no original).

Além do art. 2º da Constituição, há no art. 60, § 4º, III, a proteção a separação dos poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário).

A Declaração Francesa de 1789 é famosa por representar um momento de transição dos Direitos Humanos Fundamentais do campo do jusnaturalismo para o positivismo, onde alguns princípios basilares consagrados desde à época do Rei João Sem Terra na Magna Carta Libertatum (direito de ir e vir, garantido pelo Habeas Corpus, por exemplo) foram sendo positivados.

No entanto, somente com a Declaração de 1789 que estes princípios ganharam força e inspiraram as Constituições dos países positivados e democráticos (positivo-democráticos).

Conforme exegese do artigo 2º da Constituição, percebe-se que “a denominada tripartição dos Poderes constitui um dos princípios fundamentais” adotados pela Lei Fundamental . Nesse sentido, preceitua o art. 2º da CF:

Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Entretanto, Barruffini entende que teria sido melhor a denominação “tripartição de funções” ao invés de “tripartição de poderes” .

Leciona o autor: “Constitui erronia falar em tripartição de poderes estatais, uma vez que eles são fruto de um mesmo poder. O poder é um só, quaisquer que sejam as manifestações de vontade emanadas em nome do Estado” .

Corrobora deste entendimento Pedro Lenza, “isto porque o poder é uno e indivisível. O poder não se triparte. O poder é um só, manifestando-se através de órgãos que exercem funções” .

A proteção constitucional do princípio da separação dos poderes é corolário da Revolução Francesa. A Carta Política consagra a tripartição como cláusula pétrea fundamental, mitigando a possibilidade de abolir referido instituto.

Entre tripartição de poderes, separação de poderes, ou tripartição de funções o termo mais correto seria este. Contudo, no presente trabalho referidas expressões serão usadas como sinônimas.


2. SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS

A tripartição das funções (ou separação dos poderes) já havia sido estudada por Aristóteles, “em sua obra ‘Política’, através da qual o pensador vislumbrava a existência de três funções distintas exercidas pelo poder soberano”. (Legislativo, Executivo, Judiciário) .

Montesquieu partindo deste pressuposto aperfeiçoou a teoria de Aristóteles em “O Espírito das Leis” e contribuiu com o denominado sistema de freios e contrapesos. “em que um controla o outro e em que cada órgão exerce as suas competências. Na atualidade não se pode admitir a divisão rígida, uma vez que os órgãos são obrigados a realizar atividades atípicas” .

“A tripartição, portanto, é a técnica pela qual o poder é contido pelo próprio poder, um sistema de freios e contrapesos (...), uma garantia do povo contra o arbítrio e o despotismo”. (sem itálico no original) .

A Constituição brasileira adotou o sistema de freios e contrapesos como pode ser visto, por exemplo, no art. 84 do texto fundamental, onde permite ao Chefe do Executivo elaborar Decretos. Invadindo, desta forma, a competência do Poder Legislativo, sem violá-la, uma vez que há previsão legal.

“A teoria da separação dos poderes diz que, qualquer que seja a atividade estatal, esta deverá ser sempre precedida por normas do último tipo citado, isto é, normas abstratas e gerais, denominadas leis.” .

A teoria de Montesquieu serviu de base para diversos movimentos contrários ao absolutismo, entre eles estão as revoluções americanas e francesa, esta consagrou a obra de seu patriota no artigo 16 da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão .

Assim, violando uma lei, automaticamente estaria violando o Princípio fundamental, qual seja o da separação dos poderes, oriundo da Grécia Antiga na obra de Aristóteles, aperfeiçoado e desenvolvido por Montesquieu e elevado a status de direito humano fundamental pelo liberalismo burguês.

A “violação” só é permitida quando há previsão legal no texto constitucional. Desta forma, não haveria violação ao princípio da separação dos poderes na elaboração de Decretos Autônomos pelo Chefe do Executivo (art. 84, da CF).

3. FUNÇÕES TÍPICAS E ATÍPICAS

A separação dos Poderes, “não impede que, além de sua função típica (preponderante), cada um dos Poderes exerça atipicamente (de forma secundária) funções aparentemente atribuídas com exclusividade a outro” , como exceção, uma vez que a regra é a da indelegabilidade da tripartição das funções. Isto só foi possível devido a teoria dos freios e contrapesos desenvolvida por Montesquieu em seu livro “O espírito das leis” .

Em regra, as atribuições de um órgão não poderão, ser delegadas a outro, “trata-se do princípio da indelegabilidade de atribuições. Um órgão só poderá exercer atribuições de outro (...) quando houver expressa previsão (e aí surgem as funções atípicas)” .

Deste feito o Judiciário, por exemplo, tem por função típica de “dirimir, em cada caso concreto, as divergências surgidas por ocasião da aplicação das leis” . Mas também pode exercer funções atípicas como, por exemplo, legislar ao elaborar seu regimento interno (art. 96, I, a, da CF)” .

O Poder Legislativo, por seu turno, tem por função típica a de legislar e, atipicamente de julgar, decidindo “sobre os crimes de responsabilidade (art. 52, I e II)” e “processar e julgar os Ministros do STF, o Procurador-Geral da República e o Advogado Geral da União (art. 52, II).” .

Portanto, devido a um sistema de freios e contrapesos, uma determinada função típica pode ser exercida atipicamente que antes não eram de sua alçada, sem contudo, violar a separação dos Poderes consagrados como cláusula pétrea pelo ordenamento jurídico (art. 60, § 4º, III da CF).

4. DA IMPORTÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

Foi visto em tópicos pretéritos que o Princípio da Separação dos Poderes é um Princípio Humano Fundamental decorrente da Declaração Francesa e elevado, na Constituição Federal de 1988, a nível de cláusula pétrea.

Assim, não é demais falar que o Princípio da Separação dos Poderes ou da Separação das Funções é cláusula pétrea fundamental. Primeiro por sua origem histórica (encartado primeiramente na Declaração francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789). Segundo, por previsão expressa do legislador de 1988, que o disciplinou expressamente no artigo 60, § 4º, III (que traz as chamadas cláusulas pétreas).

O Princípio da Legalidade seria um princípio geral informador, que deve ser observado pelo intérprete ao aplicar a lei. Referido princípio não deixa de ser menos importante do que os demais, uma vez que consta no rol do artigo 5º da Constituição que trata dos Direitos Humanos Fundamentais. Além disso, também decorre do Princípio da Separação dos Poderes, elevado ao status de cláusula pétrea fundamental.

Comunga deste entendimento Barruffini ao lecionar que:

Os princípios jurídico-constitucionais são princípios constitucionais gerais informadores da ordem jurídica nacional. São desdobramentos (ou princípios derivados) dos fundamentais, como o princípio da legalidade, o da isonomia, o da autonomia individual, decorrente da declaração dos direitos. (sem destaque no texto original).

Ainda, Barruffini entende que os princípios constitucionais são “valores fundamentais albergados pela Constituição, tendo por função servir como critério de interpretação das normas constitucionais, auxiliando o legislador ordinário, na elaboração das normas infraconstitucionais” .

Fazendo, portanto, uma distinção entre o princípio da Separação dos Poderes e da Legalidade percebe-se que este serve de guia, norte para orientar o magistrado e o operador do direito na aplicação e interpretação da lei.

Enquanto aquele assegura o positivismo jurídico do Princípio da Legalidade, este observa as demais leis que deverão estar de acordo com o ordenamento jurídico pátrio, sob pena de violar a separação dos poderes e a própria Constituição Federal.

O Princípio da Legalidade, destarte, seria a célula mater, servindo de base para o Princípio da Legalidade que, por seu turno, orienta o hermeneuta na interpretação e aplicação da lei no mundo jurídico.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A separação dos poderes surgiu como princípio fundamental em 1789 na Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão. Assim, mesmo que não houvesse previsão expressa no artigo 60 da Constituição este princípio prevaleceria, devido a sua importância.

Nesse diapasão, o legislador preferiu reforçá-lo prevendo expressamente na Constituição de 1988 com status de cláusula pétrea.

Por esta dupla “proteção”, qual seja, origem histórica e previsão legal, que o princípio da separação de poderes pode ser entendido como um princípio de cláusula pétrea fundamental.

Os poderes são independentes entre si, mas harmônicos. Ou seja, podem exercer funções típicas e, desde que previsto em lei, funções atípicas. Deste modo, o termo “tripartição de poderes” estaria incorreto, haja vista que o poder é um só. A denominação “tripartição de funções” seria a expressão mais correta, portanto.

No bojo do princípio fundamental da separação dos poderes há o Poder Legislativo que se estende até o legislador infraconstitucional, por meio de leis que devam observar o princípio da separação que, por seu turno, está interligado com outro de escala inferior (princípio jurídico-constitucional informador) a ele, o princípio da legalidade.

Desse modo, uma violação a lei acarreta uma violação ao princípio constitucional da legalidade, que serve de condão entre a lei e o princípio da separação dos poderes, violando por via reflexa, a Constituição Federal e todo ordenamento jurídico.

Portanto, para coibir qualquer violação ao princípio da separação dos poderes, o hermeneuta deve, ao interpretar a lei, levar em consideração os Princípios Constitucionais, dentre eles o principal: princípio da legalidade. Se estes requisitos não forem observados haverá violação a todo ordenamento jurídico, além da própria tripartição de poderes, elevada a nível de cláusula pétrea fundamental.

Fonte:

Artigo antigo que encontrei no meio de uma grande bagunça no meu quarto.

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